Página 6 do número 72 de Cultura - Jornal Angolano de Artes e Letras
NAMIBE UMBILICAL
Le désert ne se raconte pas, il
se vit.
Mano Dayak
1 – Ciclo Perpétuo
No Namibe, ao cairem as primeiras e pequeninas chuvas de cada ano ou,
quando as manhãs de humidade, trazidas do mar pelo vento, se espalham em fino
nevoeiro sobre a terra árida, o Deserto sequioso, tira dessas escassas pérolas
aquíformes, a força suficiente para fazer renascer o capim sequíssimo e morto.
Num súbito acto de magia, um manto pálido, de um verde desmaiado, enche de
esperança os horizontes em redor.
Depois, num ciclo rápido e fugaz, que se vem repetindo desde o tempo do
Génesis, o verde pálido e desmaiado, dá lugar, no final da estação quente, a um
mar loiro como se fosse uma seara a
ondular trigos de semblante fino e bagos dourados de nada, a tilintarem um
brilho vago e vazio.
Em Junho, com o advento do Cacimbo, o capim deixa um restolho seco, muito
seco e negro, como se fosse palha queimada. Vida morta que há-de regressar ao
pálido verde quando, novamente, cairem as primeiras e pequeninas chuvas ou, quando
as humidades do mar cegarem de névoa a aridez das manhãs, envolvendo o Namibe
num forte abraço de místico e eterno retorno como se a serpente mordesse a sua
própria cauda.
Namibiano Ferreira
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