27 de dezembro de 2014

A MINHA POESIA NO CULTURA No 72


Página 6 do número 72 de Cultura - Jornal Angolano de Artes e Letras


NAMIBE UMBILICAL

Le désert ne se raconte pas, il se vit.
Mano Dayak

1 – Ciclo Perpétuo

No Namibe, ao cairem as primeiras e pequeninas chuvas de cada ano ou, quando as manhãs de humidade, trazidas do mar pelo vento, se espalham em fino nevoeiro sobre a terra árida, o Deserto sequioso, tira dessas escassas pérolas aquíformes, a força suficiente para fazer renascer o capim sequíssimo e morto. Num súbito acto de magia, um manto pálido, de um verde desmaiado, enche de esperança os horizontes em redor.
Depois, num ciclo rápido e fugaz, que se vem repetindo desde o tempo do Génesis, o verde pálido e desmaiado, dá lugar, no final da estação quente, a um mar loiro como se fosse uma seara  a ondular trigos de semblante fino e bagos dourados de nada, a tilintarem um brilho vago e vazio. 
Em Junho, com o advento do Cacimbo, o capim deixa um restolho seco, muito seco e negro, como se fosse palha queimada. Vida morta que há-de regressar ao pálido verde quando, novamente, cairem as primeiras e pequeninas chuvas ou, quando as humidades do mar cegarem de névoa a aridez das manhãs, envolvendo o Namibe num forte abraço de místico e eterno retorno como se a serpente mordesse a sua própria cauda.


Namibiano Ferreira

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