31 de maio de 2014

O REINO DAS CASUARINAS - NOVO LIVRO DE JOSÉ L. MENDONÇA





 No dia 03 de Junho (3ª feira) pelas 18H00 será lançada no Camões – CENTRO CULTURAL PORTUGUÊS  (Av. de Portugal, nº 50) a obra “O REINO DAS CASUARINAS” da autoria de José Luís Mendonça. 


Apresentação da obra pelo escritor António Panguila.

A obra “O Reino das Casuarinas” relata a história de sete angolanos vítimas dio síndroma da amnésia auto-adquirida provocada por traumas que viveram durante a guerra em Angola, no período compreendido entre 1961 e 1987. Durante o internamento no Hospital Psquiátrico de Luanda, o grupo decidiu evadir-se para fundar um Estado na Floresta da Ilha de Luanda, denominado “Reino das Casuarinas”.

O Narrador chamado “Nkuko”, mutilado de guerra e impotente devido a uma agressão que sofreu na infância, vai desfiando a história de cada um dos personagens, procurando identificar as causas do estado de perturbação de cada um deles. Conta para tal com a ajuda de um gato chamado “Stravinski”, com particulares dotes musicais, que ele trouxe da ex-Alemanha Democrática, quando terminou os estudos como bolseiro. Como personagem central, destaca-se o “Primitivo”, presente ao longo de toda a narrativa, que tenta, em vão, resgatar valores e verdades ideológicas. Os outros seis personagens (a rainha “Eutanásia”, o “Povo do Polvo”, o “PAM”, o “Profeta”, o “Katchimbamba”, e o “Cruz Vermelha”) foram vítimas de agressões pessoais, religiosas e políticas.

A obra evoca episódios que marcaram a história recente de Angola. Da guerra colonial, à independência, passando pelo conflito interno que perdurou durante largos anos depois da independência, até às dissidências internas político-religiosas.    

O objectivo idealista do grupo dos sete “alienados” de transcender a realidade insatisfatória com a criação de um Estado democrático, acaba também por ser defraudado devido à ambição de poder de um deles, que decide pôr termo à vida de todos, quando se preparavam as primeiras eleições livres naquele projecto de país utópico.

José Luís Mendonça, nascido em 1955 no Golungo Alto, licenciado em Direito, é jornalista, escritor e poeta por excelência. Foi no Musseque do Cazenga, onde viveu a infância e a juventude, que se inspirou para fazer os seus primeiros poemas. Segundo o Prof. Francisco Soares “é dos nomes relevados ao longo dos anos 80 na poesia angolana, que se destaca pela vitalidade, rigor e continuidade da produção”. Entre as obras de poesa publicadas, citam-se: “A Chuva Novembrina” (Prémio Sagrada Esperança em 1981), “Gíria de Cacimbo” (1987) e “Respirar as Mãos na Pedra” (Prémio Sonangol 1988).


José Luís Mendonça actualmente, dirige e edita o quinzenário “Cultura – Jornal Angolano de Artes e Letras”.      

29 de maio de 2014

OITO SÉCULOS DA LÍNGUA PORTUGUESA



A minha Língua é uma maresia infinda.
Quando abro a boca voam aves d’imenso
azul e ouvem-se calemas bravas,
brisas, poemas, kiandas
e ondas baixinhas a bordar marés
na orla imensa d’oceanos e continentes...


NAMIBIANO FERREIRA














NO LADO ERRADO DA HISTÓRIA

Li em e-book este livro escrito por um jornalista português, Emídio Fernado. Foi com algumas resevas que comecei a lê-lo porque estava, de certo modo, à espera de uma obra afecta à UNITA mas, para minha completa surpresa, tal não foi o caso. A obra é de uma objectividade e independência surpreendentes. O jornalista não toma partidos, nem esconde nada. Aconselho a leitura por se tratar de uma obra de grande rigor jornalístico e também histórico. Para mim, este livro revela um homem que nada teve de democrático e de respeito pelos elementares direitos humanos. Não lutou por mais nada do que a conquista do poder.


28 de maio de 2014

POEMAS NO CULTURA - Jornal Angolano de Artes & Letras


Um dos 3 poemas publicados na edição Nº 57 de CULTURA - Jornal Angolano de Artes & Letras,  Luanda 26/05/2014.



OLONGANDO

Delonga-se o tempo nas curvas espirais dos cornos do olongo.
Há pedras de vento na calçada mangonheira do tempo.
A minha mão, nua e fria, é o arado lavrando campos invisíveis
e de margens imprecisas. Vou nu por aí fora semeando palavras
sobre o papiro acetinado da aurora dos lírios ambarinos,
arrastando luz e fonemas, missangas, metáforas e poemas
que se hão-de verdadeiramente iluminar quando tu, leitor,
colheres lendo os frutos de minha lavra: pitangas rubras e poesia.



Namibiano Ferreira

Tela de AbIlio Victor


Olongo, Tragelaphus strepsiceros


ABÍLIO VICTOR - PINTOR DA FAUNA ANGOLANA

Nasceu em Malanje e a sua temática preferida é a fauna angolana.




Mas tabém pinta, por exemplo, as lavadeiras do rio Cubango.



27 de maio de 2014

IN THE NAME OF THE PEOPLE (Livro de Lara Pawson)

Mais um livro sobre o assunto, desta vez em inglês, da autoria da jornalista do "The Guardian" Lara Pawson.
   


Também em tradução portuguesa:

Em Nome do Povo
O Massacre que Angola Silenciou
de Lara Pawson

Edição: 2014
Páginas: 400
Editor: Tinta da China
ISBN: 9789896712129  

ÚLTIMAS CHUVAS


Rosa-de-porcelana (Etlingera elatior) foto Chuangpc


Chove. É na estação das chuvas – dizem –
que acontecem as coisas.


No sopro indelével do momento
soltam-se cazumbis do coração das árvores
povoando o vento, a brisa e o tempo
atormentando a vida dos homens.


Foi na paragem de Maio que Tudo 

e Nada aconteceu e chovia... 
(Não chovia?
então chovia no limbo da Poesia).


É na estação das chuvas – dizem –
que acontecem as coisas...
e nesse dia as chuvas quase acabaram.
- Onde foi na paragem de Maio que Tudo
e Nada aconteceu? – Onde foi?!
Onde foi, quem foi, como foi?





Namibiano Ferreira

26 de maio de 2014

POEMA DE SANGWANGONGO MALAQUIAS


1
Lancei os dados
no pano verde
de uma floresta
de bambus.
Aqui nem a chuva
tamborila
nem a zebra corre
por correr.
Há um rio sem margens
no caminho verdejante
onde os elefantes vão morrer.
2
Metemos o mundo
em trabalhos
só porque sonhámos
e fomos insubmissos.
Pusemos à lapela
os brilhos da lua cheia
nas facas longas
que degolaram a claridade.
Tenho na garganta um travo amargo a liberdade.
3
A cabeça virada
à cabeçada
e a voz das zaragatas.
Um semba vadio
grita gestos lancinantes
de ciúmes e facadas.
4
Se te perdi, meu amor,
encontro-te nos caminhos
onde me movi
apenas para me perder.
Quem perde os seus amores
colhe tempestades
de violinos e flores.
5
Ainda estou à tua espera
neste cemitério de navios,
na colina que o vento fustiga
às portas da foz do Bengo.
Espero por ti na lagoa
onde o sol faz ninho
e o mar se derrama em mangonha
no meu copo de vinho.
Estou à tua espera meu amor derradeiro…


Sangwangongo Malaquias

Poema retirado de Cultura - Jornal Angolano de Artes e Letras

SENTIDOS



Tela de Carla Peairo



(Para Dinah)



Trazias o mar na aurora ocidental dos teus lábios
a passar ventos e salsugens de toninhas e kiandas;

chegaste do mar, kalunga a cantar meu nome

e, estranhamente, no xinguilar dos dias
mordias bagos de jinguba nos dedos do olhar
a passar brisas a beijar ventos de kifufutila
doce veludo bailando no sopro sumaúma
soprado sobre a savana-púbis dourada do vento.



Namibiano Ferreira



Kiandas – Divindades das águas (mar, rio ou lagoa), ondina, sereia.
Kalunga – Mar, Deus e muitos outros sentidos (morte, infinito...)
Xinguilar – Ficar possuído pelos espíritos, ficar maluco.
Jinguba – Amendoim.
Kifufutila/Quifufutila – Doce com jinguba moída, açúcar, canela, etc

25 de maio de 2014

ANGOLA, A SEGUNDA REVOLUÇÃO (Livro)




Quero partilhar com os leitores desta obra parte da experiência que vivi quando jovem, durante o pro-cesso de independência do país, os anos de guerrilha que se seguiram à proclamação da independência, e o processo de negociação que conduziu às primeiras eleições da história de Angola. Esta é, antes de mais, uma narração dos acontecimentos, vistos do meu ponto de vista, como parte de uma geração, na altura adolescente, que se viu arrastada pelo vendaval da revolução, numa corrida imposta por vontades, desacordos e ambições da geração mais velha. (…) Esta obra não pretende ser história absoluta. Ela é, como disse acima, apenas uma narração da minha trajectória na luta pela inclusão democrática, relato de uma vida entregue e moldada pela "revolução".
Estas são palavras de Jardo Muekalia, no preâmbulo do seu livro, “Angola, A Segunda Revolução”.

Acabei muito recentemente de ler este livro que aconselho pela sinceridade com que Jardo Muekalia relata factos que são hoje históricos, podemos não concordar com o autor ao longo do livro mas não podemos negar a qualidade da obra, bem escrita, bem estruturada e que, mesmo quando transcrevendo memorandos políticos e outros não se torna um livro aborrecido, pelo contrário, a escrita de Jardo leva o leitor a querer saber o que se vai passar na próxima página, no próximo capítulo. Lê-se, quase como de fosse um romance. Creio que houve temas e acontecimentos não abordados, como, por exemplo, "a queima das bruxas" e, por outro lado, muitas interrogações se põem ao leitor atento e crítico, o meu livro ficou cheio de notas a lápiz. Para mim as principais questões são: Lutou a UNITA, realmente, pelo multipartidarismo, a democracia e os direitos humanos em Angola? Qual a verdadeira ideologia política da UNITA? E por fim, parece-me que Jonas Savimbi se tranformou num “warlord”, concretizada a paz não soube mais o que fazer do que guerrear, embora apregoasse a paz.

Apesar destas e de muitas outras dúvidas e questões, na última página do livro, Jardo escreve o seguinte que partilho com os leitores por estar de acordo e por ser uma verdade que é preciso, continuamente, por em prática: 
Angola será infinitamente melhor, e cada vez mais forte, quando souber acarinhar e potenciar a sua diversidade sociocultural, regional, política e económica.

DIA DE ÁFRICA - 25 DE MAIO -




Qualquer humanismo significativo deve começar a partir do igualitarismo e deve conduzir as políticas objectivamente escolhidas para a protecção e manutenção do igualitarismo.

Kwame Nkrumah, Ghana


Não somos o que deveríamos ser, não somos o que desejamos ser, não somos o que iríamos ser, mas graças a Deus não somos o que éramos.


Martin Luther King, USA

20 de maio de 2014

A PINTURA DE CARLA PEAIRO










Carla Peairo nasceu em Angola-Benguela, em 1961.
Viveu, uma grande parte da sua infância, à beira-mar: Praia-Morena, Baía-Farta, Chamume, Macaca.
O seu interesse pelo desenho e pintura começou quando tinha 13-14 anos e, até hoje a sua paixão, em transmitir África pela sua paleta de cores quentes, levou-a a realizar mais de quarenta exposições.
Viveu em Angola 22 anos onde seguiu uma formação artística de desenho, pintura e decoração na Escola Industrial de Benguela e frequentou o Instituto Superior de Ciências da Educação na cidade do Lubango.
Foi membro da Brigada Jovem de Literatura da Huíla e participou, com o Trio Mensagem, em vários espectáculos musicais apresentados no cinema Arco-Íris e no ISCED.
Adquiriu experiência profissional como decoradora, assistente social, professora de inglês e de desenho.
Em 1983 parte para Lisboa onde exerce em desenho publicitário, criação e confecção de modelos na indústria têxtil.
Admitida no Centro de Arte e Comunicação Visual - ARCO em Lisboa, frequenta os ateliers de desenho , artes gráficas, modelagem assim  como o atelier de pintura da Sociedade Nacional de Belas Artes.
Actualmente vive em Neuchâtel – Suíça, e continua a dar asa à sua imaginação.

TELA DE DUCHO 2



José António Júnior, Ducho, nasceu em Benguela a 23 de Novembro  e desde muito cedo mostrou interesse pelas artes plásticas e começou a praticar a técnica de desenho e pintura em tela, juntamente com outros jovens mais experientes em 1988, na antiga EPAT, onde também aprendeu a pintar dísticos, cartazes, cenários, painéis publicitários, serigrafia e maquetes, entre outras formas de expressão artística.

Participou em várias exposições colectivas, concursos e, igualmente, nalguns certames nacionais e provinciais em Angola. 

19 de maio de 2014

KAMUSOSO



Malembe, malembelembe*
toc toc toc...
Ngana Mbaxi**
carrega o mundo nas costas
toc toc toc...
malembe, malembelembe.
E voando, Ngana Piápia,***
voando a noite ao sol,
passa só a gritar:
piá piá piá...
– Onde está a outra metade?
piá piá piá...
– Onde está a outra metade?

Ngana Mbaxi fica só a calar
e toc toc toc...
carrega o mundo nas costas
malembe, malembelembe
toc toc toc...

Namibiano Ferreira


* Devagar, devagarinho.
** Senhor Cágado 
*** Senhora Andorinha.
Kamusoso - Pequeno conto.

(Inspirado em Parábola do Cágado Velho, de Pepetela)

16 de maio de 2014

MUKUROKA PIRIQUITO

Mukuroka Piriquito - Gravura de Mário Tendinha (Angola)


Este poema foi inspirado nesta gravura da autoria do meu conterrâneo e amigo Mário Tendinha.  Mukuroka Piriquito, aqui retratado é um conterrâneo lá do Sul, de Tômbua. Não é personagem inventada, nem pelo pintor nem pelo poeta. Ele existe mesmo. É um homem que foi guia de caçadores e turistas, conhece o deserto e a região do Parque Nacional do Iona sem precisar de uma bússola. Ele é a própria bússola e palmilha o deserto, grandes distâncias, a pé. Um grande kandandu para Mukuroka Piriquito.




MUKUROKA PIRIQUITO


Cansado, talvez de trazer nos pés o vento de pentear os dias
e o tempo das rotas esquecidas de muitas ondjiras do sul
Mukuroka Piriquito descansa no lar da fogueira acesa
no Omauha com o sol de lembrar Tchitundu-Hulu e a espiar
olho no Mukuroka Piriquito ave de voar na asa palmilhando
areias milhas e poeiras ventos e canseiras nas miragens da sede
do nosso Sul encharcado de amarelo a morrer luminoso
no afago abraço do sol derretendo welwitschias gazelas
e Tômbua que resiste no abraço velho das casuarinas heroínas
que se cansaram de lutar contra as areias que andam sob os pés
de Mukuroka Piriquito descansando à fogueira do Omauha
naquele dia que o Mário o viu e depois, talvez, o desenhou
como se fosse uma gravura perdida de Tchitundu-Hulu.
Sentado à fogueira do Omauha, Mukuroka Piriquito, descansa
do palmilhar dos dias sol-fadiga de Namibe deixando-se cobrir
de gloriosa poeira ouro que vem, como renda preciosa e ouro sobre azul,
levemente poisar sobre a nudez dos seus nonkakos a mostrar
sabedoria de quem sabe ler o sol e o brilho lúcido das estrelas do sul
sempre tão belas nas noites do deserto e os nonkakos de Mukuroka Piriquito
são luandos de cartografar mapas escritos e desenhados no céu sendeiro
sem tempo dos astrolábios presos como toninhas nos olhos vento
que se bebem nas margens sedentas do Kuroka do março da fartura.



Namibiano Ferreira 


Ondjira - palavra Tchiherero que significa caminho, ela aqui está com o plural feito á maneira portuguesa.
Omauha - significa pedra, no mesmo idioma, mas refere-se a um lodge que existe no Parque Nacional do Iona, Namibe, Angola.
Tchitundu-Hulu - é um local no mesmo Parque (Iona) que possui belas gravuras rupestres, representando animais e astros, como o sol, por exemplo. O seu nome significa "Gruta Sagrada do Céu" e é um lugar de culto para os Kwisses, um outro povo do deserto.
Nonkakos - sandálias que se fazem artesanalmente, se observarem os pés de Mukuroka podem ver os seus nonkakos.
Luando - esteira.
Kuroka ou Curoca - rio do deserto, que desagua perto de Tombua. Este rio só tem água na época chuvosa e em especial entre Fevereiro e Abril. O Kuroka é um pequeno Nilo que atravessa a aridez do município de Tombua. 

CANTIGA NA TARDE




Depois, pouco-pouco, os pingos de chuva começaram a cair nem cinco minutos que passaram todo o musseque cantava a cantiga d’água nos zincos, (...)

Luandino Vieira - Luuanda



(Para a Domingas e o Francisco)


A tarde,
vibrando calor e suor
desceu sobre a cidade
e vieram gotas
líquidas de cristal
acordar cheiros e sons...
Sobre um telhado qualquer
a prata tamborilava
uma velha melodia
e um raio de nada
despertou
recordações e lembranças:

–Cantigas tamborilando em telhados de zinco.


Namibiano Ferreira

MAIS DOIS POEMAS DE ISABEL FERREIRA


VOU EMBORA

Vou embora amanhã
levo a cratera, o frémito…
A neblina dos meus olhos
deixo-ta como lembrança

Nos dias de solidão
não terás a minha mão
suave como a seda
na tua fronte furacão!

Vou embora amanhã
levo apenas os chinelos
aqueles que me deste
no dia dos namorados

Vou embora amanhã
deixo tua soturna sombra…
No teu quarto a penumbra
não apagará o meu penedo



DO HOMEM PARA HOMEM

Busquei com ardor a liberdade
Construí castelos de esperança
Rasguei vendavais abri atalhos
Quebrei galhos…

– Fiz-me herói: – Ganhei!
Os rios cederam meus anseios
Manhãs a tudo anuíram
A cada dia novos manjares

Cada sonho…
Meu real elevado!
Esqueci-me dos pedintes
Dos mendigos outrora…

Agora…
Meus inimigos
Sou dono do mundo



Isabel Ferreira

13 de maio de 2014

9 de maio de 2014

ANDA KIANDA


Anda Kianda soltar o mar
nas tranças de minha casa
onde a água barulha cantigas
de xaxualhar marés, ondas e maresias.
 
Anda Kianda soletrar águas no limiar
átrio da casa do meu pátio:
dongo de quilha plana
mordendo os afagos do mar.
 
Dongo que já foi árvore
a xaxualhar o vento, a alma do sol
e o umbigo, espiral do tempo. 


Namibiano Ferreira


8 de maio de 2014

POETAS PÓS-INDEPENDÊNCIA 5: J.A.S. LOPITO FEIJÓO K.


Poeta e ensaísta angolano, João André da Silva Feijóo nasceu a 29 de setembro de 1963, no Lombo, província de Malanje, Angola. Mudou-se para Maquela do Zombo, onde viveu a infância, indo depois para Luanda, onde viveu no Bairro do Cazenga, a partir da sua adolescência.
Licenciado em Direito pela Universidade Agostinho Neto, em Luanda, o autor despertou para a poesia aos 22 anos de idade. Na verdade, já em 1985, publicou o seu primeiro livro de poemas Entre o Écran e o Esperma, que, fruto de grande aceitação por parte dos meios literários, recebeu uma "Menção Honrosa" no concurso de literatura "Camarada Presidente", promovido pelo INALD (Instituto Nacional do Livro e do Disco).
Foi membro da direção da Brigada Jovem de Literatura até 1984. Integrou posteriormente o trabalho coletivo do grupo "Ohandanji", que, a partir daquele ano, começou a publicar os seus textos na página cultural de O Jornal de Angola e na gazeta Lavra e Oficina (da União dos Escritores Angolanos) e que, posteriormente, como forma de ultrapassar as dificuldades provocadas pela ausência de alternativas, recorreu a edições policopiadas. Exemplo destas edições é a coleção "Katetebula/Semi-breve" na qual Lopito Feijóo publicou, s/data, no primeiro número, um texto poético intitulado "Me ditando".
Nome importante da geração de 80, a chamada "Geração das Incertezas", João Feijóo assume a rutura com os cânones semânticos e estéticos tradicionais, propondo uma estética assente numa linguagem dissonantemente metafórica e no experimentalismo visual. Com um estilo simultaneamente satírico e irreverente, a sua poiesis, caracterizada por um profundo teor lírico, é fruto de um sujeito poético revoltado e colérico que assume a melancolia como forma de exprimir a sua frustração e o seu desencanto face à realidade social e política de Angola. Esta cólera, metaforicamente simbolizada por uma descarga biliar produzida por um mal-estar hepático, é o resultado do descontentamento que lhe provocam as permanentes situações de guerra e opressão - "o veneno sorumbático" - que ameaçam, desde há muito, a sua Pátria e que, em permanente vigília, procura combater: "O veneno sorumbático inspira vigília (...)".
Como a grande parte da produção poética da geração sua contemporânea, a poesia de Feijóo recorre à metaforização do mar, enquanto lugar de meditação do "eu lírico", para exprimir o seu "olhar noturno" e insatisfeito sobre uma realidade social e política corrupta que contraria os ideais de justiça e igualdade defendidos e conquistados por gerações anteriores.
Perpassada por um claro ceticismo face aos tempos presente e futuro, a sua obra apresenta, porém, alguns momentos que nos remetem para a constatação da necessidade de repor a capacidade de sonhar e de desejar.
Em colaboração com Luís Kamdjimbo, publicou o ensaio Geração da revolução, novos poetas angolanos em volta, s/d, na qual dá voz a novos poetas, entre os quais Ana Paula Tavares, José Luís Mendonça e João Maimona.
No ano de 1988, organizou, a antologia No Caminho Doloroso das Coisas. Antologia de Jovens Poetas Angolanos, primeira antologia editada depois da independência de Angola, reunindo os textos da jovem geração dos anos 80.
Membro da União de Escritores Angolanos (UEA), escreveu os seguintes livros: Entre o Écran e o Esperma (1985), Menção Honrosa no concurso de Literatura "Camarada Presidente"; Me Ditando (s/d); Doutrina (1987), edição da UEA; Rosa Cor de Rosa (1987); Corpo a Corpo (1987); Cartas de Amor (1990); Meditando. Textos de Reflexão Geral sobre Literatura (1994).
Reconhecido e prestigiado poeta e ensaísta, a sua obra figura em revistas e jornais nacionais e estrangeiros, nomeadamente brasileiros, portugueses, galegos, norte-americanos, etc.

(Retirado Infopédia) 

Obras:

Doutrina (poesia, UEA,1987);

Me Ditando, Rosa Cor de Rosa, Corpo-a-Corpo (plaquetes de poesia, 1987);

No Caminho Doloroso das Coisas — Antologia de Jovens Poetas Angolanos (UEA 1988);

Cartas de Amor (UEA, poesia, 1990);

Meditando (ensaio e crítica, 1994).

Marcas da Guerra Percepção Íntima & Outros Fonemas Doutrinários (Nóssomos).


Três poemas de J.A.S. Lopito Feijóo K.


KURTA ÁFRICA


Não passeia e nunca desce o sol

ilumina alumia e brilha

dá-nos de njamba a ancestral robustez e

o dinamismo de kandimba sempre no auge.

Argumentados com um funge de kandumba

o calculismo e a tranquilidade dos kilambas

os azares dos capazes e a sorte dos audazes rapazes.

Turbulenta auto-estrada e fértil fragrância

alimento sem o qual hoje e depois

não somos o mesmo igual.

Autocratas burocratas tecnocratas ou democratas

aristocratas de sumaúma ou mesmo artistas de rua

com a turva suruma de repetentes olhares!



PURA & MADURA



Para Aminata Goubel

I

Chamam-me África

pari bastardos e bastantes

que mesmo sofrendo além-mar

seu berço pode e significa.

II

Ncundi ou Npangui são tão filhos quanto tu

do Burundi ou Ruanda

tenho-os tão bem em Luanda [no Kwanda ou na Ganda].

III

- Oh feitiço de carne e ossos:

Sincroniza-te

em razão dos nossos

e como sempre imenso multiplica-te-me.

IV

Sou mulher/mãe entre Yorubas e Bambaras

entrego-te-me pouca, louca e madura

PURA ÁFRICA PURA!




POEMA PRIMEIRO DA CAUSA


Não importa a cor não importa a dor

- viva a maciez do oiro.

Não importa a voz não importa a foz

- viva o caudal do riso.

Não importa o berço não importa a bênção

- viva a escavação do incauto.

(Extrair do humano o jorro bicôncavo do bicho-da-seda.

Assumir a sede de um outro irmão. Canalizar o milho

Entre nós abundante reconduzindo a lavoura à idade leal)

Não importa a malha não importa a falha

- importa a função do lema.

Não importa o galardão não importa a geração:

-       importa a assumpção da causa. ÁFRICA!



J.A.S. Lopito Feijóo K.


(CULTURA-Jornal angolano de Artes & Letras-edição XXXI)    

TRÊS POESIAS NO FEMININO

 Ana Paula de Jesus Faria Santana nasceu a 20 de Setembro de 1960, em Luanda.
Completou o curso de Ciências Económicas na Universidade de Lisboa.
A poetisa publicou, em 1986, “Sabores, Odores e Sonho” .



Música Sanguínea


No cimo do tambor
continuar brincando, queria,
mas não,
Cantar o belo,
mas as mãos, os olhos, a carne?
(quanto sofre a carne inconformada)
ter olhos passando tempo
pelo imediato,
eu passo
por aqui, sempre
(como não encontro o infinito)
a angústia no caso
que não há.
Como romper, rasgar
para essa lua entrar,
que luz?
Aonde o sol
e o tempo para soltar a voz,
a fórmula do amar
à força de estar, quem entende?
Oh, discreto riso,
suave tristeza,
olho molhado, olhando-se,
amor fardado (falhado?)
o que será dessa
música sanguínea?


Ana de Santana


**


Ana Maria Branco
Ana Maria José Dias Branco, nasceu a 24 de Maio de 1967, no município de Lucapa, província da Luanda Norte. Obras Publicadas: «Meu Rosto e Minhas Magoas» (1997) e «A Despedida de
Mim»


Sétimo Poema


Dormitei na noite coberta de frio
Enquanto sonhava
Com a tempestade que me cobria
Quando subtilmente
Entreabri os olhos
E despertei sobressaltada
Ouvindo uivos e ganidos do vento furioso a lamentar-se.


Subi os degraus da solidão
E ouvi
O vento chamar por mim,
Como quem diz:
— "Sai, Sai, procura os filhos que pariste perdidos algures pelas savanas distantes das praias ensolaradas africanas".

O medo entranhou-se-me
Nas veias ensanguentas da carne
Estremecendo a medula dos cérebros
Que tão dificilmente carrego.
O vento estava furioso comigo
E a chuva castigava-me inocente.
Estava tudo coberto e enevoado,
A água escorria e encobria
Todas as portas dos vizinhos desconhecidos,
Nenhum som era desenhado na terra figura da chuva forte.



Ana Maria Branco 

**



Nasceu em Kwanza-Sul em 1968.
Obra publicada: "Os botões pequenos sonham com o mel" (2001).


Declaração


Nasci
No ventre desencantado da serpente
No leito guarnecido das sementes

Cresci
Nos trapos sujos do desespero da rocha
Encaracolado e desfeita pelo projecto do cão

Multipliquei-me
Na corrente do desequilíbrio cívico dos sinistrados
Como uma espécie de insecto que pernoita no zumbido
                                      da argola e do conto

Morri
Sem uma bela insígnia distinguindo minhas intimidades
Sem uma coroa bonita ao redor do meu sonho

Carla Queiroz

6 de maio de 2014

MARAVILHAS NATURAIS DE ANGOLA 6


 Golungo-Alto Forest Reserv, 7 Natural Wonders of Angola. Welcome to Angola!
23
Reserva Florestal do Golungo Alto
Província: Kwanza Norte

Kuito River, 7 Natural Wonders of Angola. Welcome to Angola!
24
Rio Cuíto
Província: Cuando Cubango

Kwanza River, 7 Natural Wonders of Angola. Welcome to Angola!
25
Rio Kwanza
Província: Bié

Zaire River, 7 Natural Wonders of Angola. Welcome to Angola!
26
Rio Zaire
Província: Zaire

Leba Sierra, 7 Natural Wonders of Angola. Welcome to Angola!
27
Serra da Leba
Província: Namibe

Créditos: http://www.welcometoangola.co.ao/_angola_natural_7_wonders 

POETAS PÓS- INDEPENDÊNCIA 4: NOK NOGUEIRA

Nok Nogueira, (pseudónimo literário de Emílio Miguel Casimiro) nasceu a 24 de Dezembro de 1983, em Luanda. É jornalista de profissão e essencialmente poeta. Foi repórter e apresentador, em 2003⁄2004, do programa radiofónico Acção Humana, na Rádio Ecclésia, para além de ter tido uma breve passagem como repórter pelo já extinto Semanário Actual. Trabalha na Televisão Pública de Angola (TPA) desde 2004, produzindo e criando conteúdos para programas de Grelha.
Foi distinguido, em 2004, pelo Instituto Nacional do Livro e do Disco (INALD), com o Prémio Literário “António Jacinto” pela obra poética “Sinais de Sílabas”, Luanda. Irregularmente, publica textos poéticos e de análise crítica no suplemento do Jornal de Angola Vida Cultural.
Ricardo Riso, crítico literário e professor universitário brasileiro, considera-o como “um dos pilares da nova geração poética angolana”.

Obra Poética:

Sinais de Sílabas, Prémio Literário “António Jacinto”, pelo Instituto Nacional do Livro e do Disco (INALD), Colecção A Letra. Luanda, 2004.  
Tempo Africano, União dos Escritores Angolanos (UEA), Luanda, 2006.
Jardins de Estações, Nóssomos, Vila Nova de Cerveira, 2012
As Mãos do Tempo, Nóssomos, Vila Nova de Cerveira, 2012



Excerto do livro  Jardins de Estações

[…] aqui reside o sonho a chancela das rosas é um pretexto
para que a mão se deixe plena de pétalas policromas
enquanto vemos nascer o dia pelo ângulo do tédio
que nos deixara impotente diante do frágil nascer
da dúvida enquanto não víamos nova mente o regresso
de um pregresso legado que nos encontrasse diante
do tempo a colhermos frutos fora de ocasião
para aprendermos a reivindicar a gratidão dos dias
em que nada pudemos alcançar das mãos que apenas
nos podiam mostrar a idade de nossas petições
venha o verão por mais tarde que se faça outorgar-nos
uma versão elíptica do amor no entanto sabe-se ainda
o fruto maduro pela boca das crianças
ouvem-se novos acordes de viola hoje para amenizar
a exaustão a dor
o dia continua à paisana como se as chuva custassem
a chegar até nós
jamais constatei o silêncio com uma irrelevante noção
de queda tudo que se cala na superfície terrestre tem
uma voz que mantém vivo
tal é o silêncio de nossas falas é a voz do vento
agora que a cidade aguarda pela chegada do esvoaçar
das gaivotas
lembro-me de mim mesmo ao cruzar as encruzilhadas
dos caminhos e tudo me parece tão estranho
a seca esta já não a vejo mas uma triste ideia de fome
persiste engravatando meu canto de tão pequeno que é […]


Excerto do livro: As Mãos do Tempo

[…] corre o tempo em minhas mãos e a voz é a mesma que tece os limites do sonho
contida no gesto e na margem das palavras que não dizem o que vai em nós
e nova mente constatamos o silêncio em surdos lençóis sobre as nossas mãos
enxergamos o que nada vemos caminhamos quase indiferentes ante a miséria
dos dias que vestem de silêncio as ruas e as velhas avenidas tão iguais a elas
mesmas
trago entretanto um dia exposto sobre os meus ombros com a exacta sensação
de ter ganho uma nação inteira mente subjugada ao torpor de meus passos que
tímidos pisam o asfalto doentio de tanto me ver por aqui passar pesaroso
e olho as paredes tão iguais a mim tão frias e quietas tão fúnebres e sedentas
como se nada fosse o olhar das gaivotas pousando sobre as árvores que velhas
de um tempo vergastado pelo somar dos séculos deixam-se estéreis perante
o vagido de quem corre por entre as esquinas do desencanto  a ver com que voz
com que palavra conseguirá outorgar um novo e ledo caminho ledo à nação […]


O RIO
Quem ouve o silêncio de um mundo vazio ouve enfim a voz do vento. Lamentável fora a vida antes dela se tornar como tal, pois nunca a tivera visto como sendo um instante primeiro de que me devia ainda orgulhar. O que existe entre mim e o nada das coisas é exactamente este silêncio de que me detenho submisso desde que aqui me revejo como homem, como instante de vida humana. Antes de mim existira entre os homens um contíguo de pétalas róseas ao qual nunca se fizera comparação alguma. Hoje, o que restou de um milésimo de vida são apenas reflexos dos tempos que se não apagam, pois eles estarão sempre presentes, como as flores que hoje cravo nos lábios das mulheres que vejo passar em meus sonhos. Não vejo quantos ventos ainda hei-de de colher, vejo apenas a imagem de um rio que breve se me apresenta, fosse uma manifesta declaração de amor que a qualquer instante há-de chegar aos meus ouvidos.
Nok Nogueira

Rio, in. Pensamentos, blog do autor: http://noknogueira.blogspot.co.uk/