7 de setembro de 2010

CARTA DE MARTIN LUTHER KING A UMA ANGOLANA (Deolinda Rodrigues de Almeida)

Foto Jornal de Angola (on line)


No dia 21 de Julho de 1959, da cidade de Montgomery, no Alabama, Martin Luther King escrevia à heroína angolana:


Senhorita Deolinda Rodrigues

Muito lhe agradeço pela sua muito amável carta, de data recente. Li cada linha que me escreveu com grande interesse. É realmente encorajador saber do seu interesse na libertação do povo do seu país. Estou bastante contente em receber informação em primeira-mão sobre a situação em Angola. Tive notícias a partir de outras pessoas que vivem fora do país, mas não há nada melhor do que receber notícia em primeira-mão.

Parece que os portugueses são as pessoas mais lentas a largar mão das suas possessões em territórios estrangeiros. É lamentável que lhes falte a visão para se aperceberem do que está traçado para esses territórios. É sempre trágico ver um indivíduo ou uma nação tentando impedir ou parar uma irresistível onda.

Criar uma liderança

Não sei se posso dar-lhe alguma sugestão concreta sobre o que fazer na vossa particular situação, pois muitas vezes é necessário ver com os próprios olhos antes de poder dar uma resposta definitiva. Direi, contudo, que o primeiro passo para corrigir a situação é criar uma verdadeira liderança no seu País. Alguma entidade ou algumas poucas entidades devem posicionar-se como símbolos do vosso movimento para a independência.

Logo que tal símbolo seja encontrado não é difícil conseguir que as pessoas o sigam e quanto mais o opressor procurar deter e derrotar esse símbolo, tanto mais ele consolidará o movimento. Seria maravilhoso regressar ao seu país com esta ideia na mente A liberdade nunca é alcançada sem sofrimento e sacrifício. Só se conquista com trabalho persistente e incansáveis esforços de pessoas dedicadas.

A senhorita Deolinda Rodrigues deve também saber que aquilo que vem acontecendo noutros países de África terá inevitavelmente repercussões no seu país. Será impossível Angola permanecer em África, sem ser afectada por aquilo que acontece na Nigéria, no Quénia e na Rodésia (referia-se à Zâmbia, então chamada Rodésia do Norte). Portanto, a vossa verdadeira esperança reside no facto de que a independência será uma realidade em toda a África, dentro dos próximos anos.

Dirijo à senhorita Deolinda Rodrigues as minhas orações e os melhores votos de bênçãos de Deus, em tudo o que estiverem a fazer. Espero que os seus estudos continuem de maneira a serem frutíferos e compensadores.

Em encomenda separada envio-lhe um exemplar do meu livro “Stride Toward Freedom”. Queira aceitá-lo como oferta minha. Espero que lhe venha a ser útil este meu humilde trabalho.

Muito sinceramente, me subscrevo

Martin Luther King, Jr.

 
Visão política
 
O reverendo Martin Luther King revela nesta carta uma visão política fora do comum. Tudo o que afirmou a Deolinda Rodrigues, então ainda jovem estudante no exílio, aconteceu. As independências nas antigas colónias de África sucederam-se em alta velocidade e, na verdade, só ficaram para o fim as antigas colónias portuguesas, porque uma ditadura feroz se convenceu de que era possível travar a imparável onde de liberdade que varreu o continente africano.
- Esta carta de Martin Luther King a Deolinda Rodrigues foi “descoberta” por Loide Ana Santos e o embaixador Ismael Martins, que a fizeram chegar à família através do deputado Roberto de Almeida, vice-presidente do MPLA.

Créditos: http://jornaldeangola.sapo.ao/20/0/carta_de_martin_luther_king_a_uma_angolana_na_revolucao
 
Breve nota sobre Deolinda Rodrigues de Almeida, mais conhecida por Deolinda Rodrigues:
 
Deolinda Rodrigues de Almeida e as suas companheiras Irene Cohen, Engrácia Paim, Lucrécia dos Santos e Teresa Afonso, na luta contra o colonialismo português foram incorporadas como combatentes do Esquadrão Kamy, coluna guerrilheira preparada e treinada em 1966 por internacionalistas cubanos e cuja arriscada missão consistia em levar reforços desde a fronteira congolesa até à Primeira Região Político-Militar do MPLA. No interior de Angola, numa longa e penosa marcha, em zona de terra queimada, o Esquadrão perdeu-se, e a fome dizimou uma grande parte dos combatentes, especialmente dos quadros.
Deolinda e as suas quatro companheiras, dirigentes da OMA (Organização da Mulher Angolana), sobreviveram à inclemência das condições climatéricas e do terreno inóspito. Empreenderam o regressando via Zaire (hoje RDC), foram presas, nos arredores da pequena vila de Kamuna, pela FNLA e posteriormente assassinadas. O dia da sua detenção – 2 de Março de 1966 – foi consagrado  Dia da Mulher Angolana.

2 comentários:

  1. Olá Caro amigo
    Foi bom retornar aqui e conhecer um pouco da história de Deolinda Rodrigues. Também é muito bom refletir sobre as palavras de Luther King que quanto mais o opressor procurar derrotar uma verdadeira liderança tanto mais ele consolidará o movimento. Depois de libertos do jugo colonial surgem outros tipos de opressores. É preciso derrotar um leão por dia. E quando temos a sorte de ter uma liderança sincera é preciso apoiá-la. Angola teve Agostinho Neto, nós no Brasil temos Lula.
    Um abraço

    ResponderEliminar
  2. Desconhecia totalmente os factos.
    Até mesmo que o dia 2 de Março era o Dia da Mulher em Angola.
    Este mundo da Internet não é tão mau como apregoam.
    Aprende-se muito.

    Um abração.

    ResponderEliminar

Obrigado pela visita e comentário!