MARIA JAVA
Ninguém sabia de onde ela veio, quem era ou o que pretendia. Se é que pretendia alguma coisa. A meio da estação seca apareceu na Vila, grávida e semi-nua, com um par de seios a parecerem dois maboques provocantes. Era uma mulher bela, elegante e enigmática. Não andava, deslizava pela Vila sem nunca falar ou estabelecer qualquer forma de contacto. Também não pedia e mantinha uma certa altivez.
As mulheres da Vila inventaram estórias sobre ela, conversas, bisbilhotices e mujimbos. Kuribotices, enfim, que só as mulheres sabem criar sobre outras mulheres. Por qualquer estranha razão as mulheres da Vila não gostavam desta ave de arribação vinda sabe Deus de onde. Só D. Dominguinhas, sekula de muitos cacimbos e chuvas, fez saber que sabia alguma coisa sobre esta solitária e estranha mulher. O respeito e a credibilidade da velha sekula, parteira nas horas vagas e lavadeira de profissão desde os tempos coloniais, trouxe as orelhas das mulheres até à boca de D. Dominguinhas que beijando seus dedos em cruz falou: “ Juro, por Nzambi! Estava lá na margem do rio sozinha mesmo a lavar umas roupas quando ela apareceu do lado donde o Sol dorme. Chegou assim mesmo do nada, a última vez que olhei naquela direcção, eu vi poisar uma ondjava, depois mesmo ela apareceu, de tanga e mamas a apontar o céu. Agora, vocês num me perguntem mais nada mas o andar dessa moça me faz lembrar uma ondjava.” E deu uma gargalhada sonora e cantante daquelas que só uma mulher kwanhama sabe dar. E foi assim, D. Dominguinhas virou madrinha de Maria Ondjava, mais tarde ficou só Maria Java.
Maria Java não se misturava com o povo da Vila, limitava-se a passear, a deslizar pelas ruas. Vivia junto da minha margem, fora da localidade, numa cubata que mais parecia um amontoado de folhas e galhos velhos e secos. As gentes da Vila, isto é, o mulherio, chamavam, com desdém, o ninho da Java e realmente parecia um ninho. (...)
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