20 de março de 2012

DIA MUNDIAL DA POESIA - 21 DE MARÇO


Aos dez anos de idade li o poema  A Mulemba Secou da autoria do poeta angolano, Aires de Almeida Santos. Foi o descobrir da Poesia de temática e raiz angolanas. Uma poesia que ecoava pela alma as vozes da terra. Mais tarde vieram Viriato da Cruz e Agostinho Neto, marcos importantes no meu “escrevinhar” poesia mas nunca consegui esquecer o dia primeiro em que li A Mulemba Secou. Quando mais tarde comecei a escrever, Aires de Almeida Santos estava, consciente e incosncientemente presente. Ele foi a minha fonte primária, a minha mais directa influência. Neste Dia Mundial da Poesia deixo aqui o poema que há mais de 40 anos me abriu o caminho da Luz e da Poesia:
Aires de Almeida Santos



A MULEMBA SECOU


No barro da rua,
Pisadas
Por toda a gente,
Ficaram as folhas
Secas, amareladas
A estalar sob os pés de quem passava.
Depois o vento as levou...


Como as folhas da mulemba
Foram-se os sonhos gaiatos
Dos miúdos do meu bairro.


(De dia,
Espalhavam visgo nos ramos
E apanhavam catituis,
Viúvas, siripipis
Que o Chiquito da Mulemba
Ia vender no Palácio
Numa gaiola de bimba.


De noite,
Faziam roda, sentados,
A ouvir,
De olhos esbugalhados
A velha Jaja a contar
Histórias de arrepiar
Do feiticeiro Catimba.)


Mas a mulemba secou
E com ela,
Secou também a alegria
Da miudagem do bairro:


O Macuto da Ximinha
Que cantava todo o dia
Já não canta.
O Zé Camilo, coitado,
Passa o dia deitado
A pensar em muitas coisas.
E o velhote Camalundo,
Quando passa por ali,
Já ninguém o arrelia,
Já mais ninguém lhe assobia,
Já faz a vida em sossego.


Como o meu bairro mudou,
Como o meu bairro está triste
Porque a mulemba secou...


Só o velho Camalundo
Sorri ao passar por lá!...


Aires de Almeida Santos
(Meu Amor da Rua Onze)

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