12 de abril de 2010

PORQUE OS RIOS...

Rio Cubango (foto net)


                                                        A partir de um comentário de Cirandeira:
"Águas não têm cabelos", dizem em minha terra.


As águas não têm cabelos
são pranto brisa canto
uma líquida clepsidra
solta arrastando tempo
corpo, mistério de Kianda.
As águas não têm cabelos
são a Kianda em si mesma
penteando a cabeleira
ao longo do rio a passar
e as águas não têm cabelos
são mosto a lançar uanda
no feitiço a fluir novelos
a boiar sortilégios e mitos
porque os rios... as águas
dos rios não têm cabelos...

Namibiano Ferreira

Kianda - divindade das águas.
Uanda - rede de pesca.

12 comentários:

  1. Maravilha Namibiano. Gostei muito, desta das águas não terem cabelos! Só mesmo coisa de poeta para imaginar essas coisas assim lindas... e descabidas!

    Kandandu.

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  2. Lindo! Deste um outro sentido à expressão: ao invés do medo de afogar-se nas águas profundas de um rio, encheste-o de magia, de mistérios e encantos! A Kianda, corresponderia à nossa mãe-d'água,
    a Oxum, a protetora dos rios.

    Kandandu

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  3. Amigo das terras deserticas de Angola.

    Quanta magia nas palavras! Senti a mão envolvente da Kianda a afagar-me e a motivar-me para a vida.

    Elas (a Kianda e a poesia) libertaram-me da uanda desta vida.

    Um abração e muito agradecido pela fiel e dedicada visita ao meu blog.

    Os comentários do meu kamba me encorajam a caminhar nesta senda das palavras.

    Maravilho-me ainda pois temos amigo em comum, poeta q aprecio, Décio Bettencourt.

    Kandandu

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  4. Gostei tanto deste poema, desliza e tem movimentos como as águas de Kianda.
    Acho formidável quando se estabelece um diálogo assim na net.
    Pequenina sugestão: "mesma", em vez de "mesmo".
    Pergunta: Kianda é a rainha de todas as águas, ou só das doces, ou só das salgadas? No candomblé brasileiro, nós temos Yemanjá, que é rainha do mar (ela tem 5 nomes, um deles sendo Janaína). E, na tradição dos nossos índios - mas que a umbanda também incorpora -, temos Iara, ou Yara, rainha dos rios.
    Kandandu

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  5. Décio, o poema aconteceu depois de um comentário de Cirandeira, na terra dela o povo, na sua imensa sabedoria, diz que "águas nao tem cabelo" e daí nasceu o poema.
    Kandandu

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  6. Cirandeira, ainda bem que gostaste. Sim, o que dizes é verdade, transformei o medo no mistério, na forca criativa e divina da Kianda.
    Kandandu

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  7. Nguimba, a tua presenca é sempre bem vinda. Ainda bem que gostaste do rio corpo e magia na uanda da Kianda, lacando sua uanga ou sua bencao.
    O Décio é um amigo já delonga data. Um excelente poeta.
    Kandandu

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  8. Janaina, obrigado pelo reparo, tem toda a razao pois se refere á Kianda. Mas eu quando estava fazendo/acontecendo o poema e sentia-me EU a ser o rio, a água a correr e eu era a Kianda em mim mesmo. Nao sei o que a maioria dos poetas sente quando escreve mas por vezes eu me sinto um médium, um "cavalo-de-santo" transmitindo coisas que sao minhas e que por vezes parecem nao ser, uma comunicacao que vem de fora ou talvez de um outro eu aprisionado num mesmo e único corpo. Por isso é que desde muito cedo procurei assinar a minha poesia com um nome que nao o meu de batismo.
    A Kianda é uma divindade da religiao do povo Ambundu (Idioma kimbundu) habitualmente traduz-se por sereia e realmente está relacionado como culto dos sirénios. Pelo que eu sei ela está muito equiparada com Yemanjá. Fazem-se ofertas á Kianda, sobretudo os pescadores. Ofertas de comida, pentes, contas, espelhos...
    A Kinda, quando referida em geral é a Kianda do mar, mas todo o lugar que tenha água,
    rio, lagoa, riacho, cachoeira, cacimba, lago... tem a sua própria Kianda. Que é adorada e também temida.
    Obrigado pelas informacoes sobre Yemanjá.
    Kandandu

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  9. Olá Namibiano, mais um bonito momento de poesia

    obrigada pela partilha

    beijinhos


    bom fim de semana

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  10. Kandando.
    :)

    eu gosot de inaginar a água dos rios a pentear os cabelos da Kianda...

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  11. Olá Namibiano!
    Acabei de descobrir o seu blogue porque andava à procura de informações sobre a baoba, não sabia como se dizia em português. Agora já sei: imbondeiro! Descobri também que é poeta. Eu sou professora e gostava de saber se escreve para crianças (pensa que a sua poesia pode ser para crianças?) e se para além de poesia escreve contos ou outro tipo de texto destinado aos mais jovens.
    Abraço e bom trabalho! Vi o blogue a correr, mas pelo que vi, gostei! Parabéns!

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  12. Parabéns!
    Muito lindo. No Brasil o culto às Ianda é vivo. Seja ligado ao mar (Kalunga), que é Mam'etu/Nengua Kayala/Samba Kalunga, seja ligada às águas doces como Mam'etu/Nengua Kissibi/Ndandalunda.
    francgunzo@gmail.com
    Tata Makishi

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