Como havia prometido no poste sobre Tchitundu-Hulu, hoje apresento o Kane-Wia.
Como vos prometi na postagem sobre Tchitundo-Hulu aqui estou hoje para vos falar de um outro morro do Namibe. Bem no interior, próximo da localidade do Virei, existe um morro a quem os Ovakuvale (Mukubais) chamam de Kane-Wia. É um lugar que povoa o imaginário sobrenatural da minha infância... não conheço o lugar mas depois que vos traduzir o nome do morrro em português, mesmo os menos descrentes, vão pensar duas vezes se lá querem ir.
Kane-Wia é o Morro “quem sobe não volta” ou “ quem o subir não volta” e a verdade é que o Kane-Wia é um acidente geográfico pouco conhecido e mesmo deixado á sua sorte. Se pedirem a um homem Ovakuvale para ele vos acompanhar como guia ele prontamente recusará nem que o pagamento sejam manadas de bois, já que ouro e dinheiro, são coisas sem valor para um homem Mukubal. O Kane-Wia é tabu para os Ovakuvale: é kane-wia (quem o sobe não volta a descer, desaparece, faz uafa, morre). Portanto, o Kane-Wia vivia sossegado e inexplorado, uma espécie de montanha sagrada onde Deus dorme e, por esse motivo, interdita ao comum dos mortais.
Em 1937, um eminente biólogo da Universidade de Coimbra, Dr. Luís Wittnich Carrisso, veio até ao Namibe para estudar a flora local e como homem racional e de ciência que era resolveu contrariar a crença subindo o Kane-Wia. Seja por mera coincidência ou por outra estranha razão o grande cientista português, embora socorrido pelo seu companheiro, veio a sucumbir em pleno deserto, a cerca de 80 km da cidade de Moçâmedes (actual Namibe). Nesse mesmo local foi, posteriormente, erguida uma lápide com a seguinte inscrição: “Dr. L. W. Carrisso XIV-VI-MCMXXXVII”.
Namibiano Ferreira
Há falta de imagem do Kane-Wia, ficam as Montanhas de Tchamalinde no Namibe
Para terminar, um poema da minha autoria e inspirado no Kane-Wia mas para uma outra realidade. Este poema (anterior a 1998) faz parte de um poemário intitulado “No Vento e No Tempo”, cujos poemas não têm título mas são numerados de 0 até 46.
QUE SUBA O MWATA O KANE-WIA
O tempo arrasta garroa
como se fosse um vento fétido
expirado por deuses amnésicos.
Na noite, oximalankas e mabecos,
dão risadas sob o luar da Morte.
O tempo traz garroa no ventre
e uma aridez uterina ondula despertando
o Kazumbi ancestral que vem dizendo:
– Que suba o mwata o Kane-Wia,
Depressa-depressa!
– Que suba o mwata o Kane-Wia,
a montanha quem sobe não volta
para nunca mais impedir a chuva
sobre a terra, roseira bela!
– Que suba o mwata o Kane-Wia,
deixando açucenas florindo
nos ombros dos caminhos e sobre a terra,
roseira bela, a chuva crepitando
purgando e redimindo nosso corpo
desalmado e sem sentido.
– Que suba o mwata o Kane-Wia...
Namibiano Ferreira (in No Vento e No Tempo)
Mwata – senhor, chefe, líder.
Oximalankas – hienas.
Mabeco – cão selvagem.
Meu caro,
ResponderEliminarmuito bom o poema,
mas senti falta de uma foto
do Kane-Wia. Não foi possível obtê-la?
Em tempo:
o Balaio de hoje se volta mais uma vez para Angola.
Kandandu.
[crepitante a palavra, deserto em deserto cheio de letras e respiração do mundo; da terra mais elevada]
ResponderEliminarum imenso abraço, Caro Namibiano
que de quatro faz dois braços
Leonardo B.
Moacy, quando vc comentou anda ainda procurando uma imagem do Kane-Wia, que nao encontrei. Já espiei o Balaio, otimo como sempre.
ResponderEliminarKandandu
Leonardo B.
ResponderEliminarSejas bem vindo a esta Ondjira,
kandandu
Muito instigante a história do O Kane-Wia. Quem sabe um dia teremos
ResponderEliminarcondições de desvendar esse mistério que a envolve e então poderemos visualizá-la através de
fotos, pelo menos. De qualquer maneira, essa foto das montanhas de
Tchmaline é muito bonita. Como toda
a África, aliás.
Teu poema é muito bom!
Kandandu
Em tempo: na semana passada estava em outro blog que tenho e postei um
comentário aqui. sem aperceber-me que não estava como "cirandeira",mas como "giramundo". Não deves ter entendido nada...Distrações acontecem...!?
Se eu tivesse nascido Mukuval também não afrontaria o Deus adormecido da montanha sagrada! Deixaria que o seu mistério permanecesse no nosso imaginário...
ResponderEliminarO seu poema, belo, como sempre, principalmente quando é escrito com o coração de um poeta que também ainda não afrontou o Morro Sagrado!
Kandandu. Otelinda
Parabéns pelo rico poema, Namibiano.
ResponderEliminarNamibiano quando venho a esta sua "casa" respiro outra cultura, sons, cores.
ResponderEliminarObrigada amigo
Bom fim de semana
Carmo
Cirandeira, foto do Kane-Wia só encontrei num livro. A foto é a preto e branco, muito pequena e antiga. Ao ser digitalizada nao se percebe bem o que é. Assim esta é melhor,
ResponderEliminarKandandu
Otelinda,
ResponderEliminarPode querer que nao tenho ideia nenhuma de subir o Kane-Wia... eheheh
Kandandu
Gerana, obrigado pela visita!
ResponderEliminarkandandu
Lourdes, a sua visita e as suas palavras foram apreciadas e escutadas por aqui com um grande sorriso. Espero-a te-la por aqui com frequencia.
ResponderEliminarKandandu
Carmo, que possa sempre respirar a LIBERDADE, PAZ e IGUALDADE neste blog. Obrigado pelas suas palavras amigas.
ResponderEliminarKandandu
Saudações do Brasil! Sou apaixonada pela cultura e pela natureza angolana! Espero um dia visitar seu país! amo seu povo! Obrigada por ter disponibilizado esse lindo material!
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