31 de maio de 2013

SÔ SANTO - POEMA DE VIRIATO DA CRUZ




O Pensador - Arte Angolana, Tchokwé



SÔ SANTO

Lá vai o sô Santo...
Bengala na mão
Grande corrente de ouro, que sai da lapela
Ao bolso... que não tem um tostão.

Quando sô Santo passa
Gente e mais gente vem à janela:
- "Bom dia, padrinho..."
- "Olá!..."
- "Beçá cumpadre..."
- "Como está?..."
- "Bom-om di-ia sô Saaanto!..."
- "Olá, Povo!..."

Mas por que é saudado em coro?
Porque tem muitos afilhados?
Porque tem corrente de ouro
A enfeitar sua pobreza?...
Não me responde, avó Naxa?

- "Sô Santo teve riqueza...
Dono de musseques e mais musseques...
Padrinho de moleques e mais moleques...
Macho de amantes e mais amantes,
Beça-nganas bonitas
Que cantam pelas rebitas:
'Muari-ngana Santo
 dim-dom
ualó banda ó calaçala
 dim-dom
chaluto mu muzumbo
 dim-dom...'
Sô Santo...

Banquetes p´ra gentes desconhecidas
Noivado da filha durando semanas
Kitoto e batuque pró povo cá fora
Champanha, ngaieta tocando lá dentro...
Garganta cansado:
 'coma e arrebenta
 e o que sobra vai no mar...'

Hum-hum
Mas deixa...
Quando Sô Santo morrer,
Vamos chamar um Kimbanda
Para ngombo nos dizer
Se a sua grande desgraça
Foi desamparo de Sandu
Ou se é já própria da Raça..."

Lá vai...
 descendo a calçada
A mesma calçada que outrora subias
Cigarro apagado
Bengala na mão...

... Se ele é o símbolo da Raça
ou a vingança de Sandu... 

Viriato da Cruz (1928 - 1973)

1 comentário:

  1. O perfume de Angola num belo poema do Viriato da Cruz.
    Bom início de fim de semana, Caro João.
    Abraço.

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